terça-feira, 24 de novembro de 2015

018 - Um Cão Chamado Oito

Há muito tempo, algumas pessoas têm me pedido para que eu dê notas às obras discorridas nas postagens da Filmoteca, da Biblioteca e da Discoteca, como se fazia nos tempos dos Culture Rangers. Desde que iniciei os trabalhos com os trigêmeos, sempre fui contra este tipo de coisa, porque eu achava que apenas o texto deveria servir para dar a minha opinião (mesmo por baixo da ironia e do sarcasmo eventualmente expressos), sem precisar de algum sistema de cotação para escancarar tudo. O importante, para mim, era despertar a curiosidade de você, leitor@, a ir buscar a obra e conferir se concorda ou não comigo.
Eventualmente, comecei a repensar minha posição, e fiquei indeciso. Portanto, resolvi deixar a decisão com VOCÊS! A partir de hoje, até o dia 06/12/2015, os posts da Filmoteca (e dos Trigêmeos, como um todo) terão um sistema de nota que julguei interessante. Mas dependerá de VOCÊ se este sistema continuará no ar. Próximo ao final desta postagem, há uma enquete. Por favor, responda-a (se quiser, pode votar quantas vezes desejar) - lembre-se que os Trigêmeos existem por minha vontade, mas persistem por VOCÊ, então, dê seu pitaco!
O filme de hoje me é especial por N razões. Tocar fundo em mim como ser amante de animais que sou a ponto de assistí-lo sempre e ter um fruto seu me acompanhando sempre com certeza é a maior destas razões. Ser uma obra que minha família inteira pode sentar junto e assistir, formando um momento especial, é outra.
Aposto que tod@s vocês já sabem de que filme falo, não? Vamos aos trabalhos!

Fonte da imagem: http://www.traileraddict.com/

Título: Sempre ao Seu Lado
Título Original: Hachi: A Dog's Tale
Distribuição: Stage 6 Films
Produtora: Hachikō, Grand Army Entertainment, Opperman Viner Chrystyn Entertainment, Scion Films e Inferno Production
Data de lançamento: 13/06/2009
Direção: Lasse Hallström
Produção: Bill Johnson, Richard Gere e Vicki Shigekuni Wong
Roteiro: Stephen P. Lindsey (baseado no roteiro do filme "Hachikō Monogatari", de Kaneto Shindô)
Elenco: enésimos cachorros (Hachi)
Richard Gere (Parker Wilson)
Joan Allen (Cate Wilson)
Sarah Roemer (Andy Wilson)
Robbie Sublett (Michael)
Cary-Hiroyuki Tagawa (Ken Fujiyoshi)
Jason Alexander (Carl Boilins)
Erick Avari (Jasjeet)
Davenia McFadden (Mary Anne)
Kevin DeCoste (Ronnie)
Tora Hallström (Heather)
Frank S. Aronson (Milton)
Se o cartaz do filme não lhe deu uma dica suficiente do que se trata o post de hoje, o GIF abaixo deixará bem claro! Prepare babadores e lencinhos!
Fonte da imagem: http://33.media.tumblr.com/

É muita fofura, gente!
Como amante de animais e da natureza, ver a chamada de um filme inédito na televisão sobre um cão virou programa obrigatório numa noite de sábado. Chamei dona Sassá para ver comigo. Ela estava desinteressada. Argumentei "É com o Richard Gere!" - e consegui a companhia no sofá. Então, ficamos no sofá e aturamos a Zorra Total para assistir Sempre ao Seu Lado.
Fonte da imagem: https://en.wikipedia.org/
Sempre ao Seu Lado é inspirado no roteiro do melodrama japonês "Hachikō Monogatari" - que, por sua vez, canaliza a história real de um cão chamado Hachikō, que viveu entre 1923 e 1935, e ficou famoso nacionalmente por esperar seu humano, Hidesaburō Ueno todos os dias na estação de trem que ele utilizava para ir e voltar da universidade onde lecionava - e se tornou um símbolo japonês de fidelidade.
Acho que um parágrafo sobre o nome é válido. Primeiro, porque são poucos os não-japoneses que conseguem pronunciá-lo corretamente. É fácil: RÁ-tchi-CÓ (a quentidade de gente que fala ra-CHÍ é incrível, mas aí, se falam dos palitos que os orientais usam para comer - hashi). Outro motivo é porque o próprio nome é uma coisa linda: numa tradução bem Google Translate, o nome dele pode significar "o oitavo filho", "a oitava criança" ou mesmo "o oitavo príncipe". De acordo com o site About.com, o número oito ("hachi") é considerado um número de sorte, porque o ideograma kanji para a palavra () consiste em dois cursos que sugerem o desenho de um monte. Ambos os cursos são mais largos na parte inferior, o que, para os japoneses, significa bons presságios. O "kō" é uma expressão carinhosa, como "chan", mas de cunho mais infantil e terno. Logo, um cão chamado Hachikō só poderia ser alguém MUITO especial, não?
Fonte da imagem:
OK, vamos a Sempre ao Seu Lado!
Créditos iniciais: quando vi o nome Lasse Hallström na direção, pensei imediatamente em ABBA! Sim, o senhor Hallström foi, para o bem e para o mal, o cara que dirigiu TODOS os videoclipes feitos pelo megagrupo sueco. Portanto, eu comecei a esperar por alguma estética megabrega e altamente corajosa como a dos clipes do quarteto, num misto de temor e curiosidade. Isso não veio. Embora bem piegas e carregado no sentimentalismo comum de filmes de animais - cães, especialmente -, a direção de Sempre ao Seu Lado é bem segura e regular, tipo "nada-fora-do-lugar".
Fonte da imagem: http://www.imdb.com/
Foi através de Sempre ao Seu Lado que fiquei curioso em conhecer mais do mentor dos vídeos do ABBA e descobri que não apenas ele tem três indicações ao Oscar nas costas, mas que eu já conhecia o lindíssimo "Minha Vida de Cachorro", e passei a conhecer "Chocolate", "Regras da Vida", "Gilbert Grape: Aprendiz de Sonhador" e, claro, "ABBA - O Grande Show"! Também soube que "Querido John" foi responsabilidade dele, mas ainda não vi o filme! E por suas mãos, mais um filme canino vem aí: ano que vem será lançada a versão cinematográfica do livro "A Dog's Purpose".
Resumindo, a filmografia do senhor Hallström: a) tem preferência por temas como infância e vida animal por ser vegano; b) é (aparte do filme do ABBA) grandemente baseada em adaptações literárias; e c) é para assistir com muitos lencinhos ao lado! Considerem-se avisad@s!
A história não tem nada de novo a oferecer possui muitas novidades em seu gênero, mas é extremamente eficiente entre os seus: um filhote de cão da raça Akita é enviado do Japão a um destino não especificado nos Estados Unidos, mas acaba extraviado por um acidente de percurso e cruza caminho com o professor universitário Parker Wilson. Como o cão não possui qualquer informação consigo a não ser o kanji "hachi" na identificação da coleira, e o danado resolveu seguí-lo, o pobre professor não possui outra alternativa que não seja levar o cão para casa - onde Cate, sua esposa, não quer nem saber do pobre bichinho (ela está enlutada por um canino anterior e naturalmente não quer passar por todo o ciclo de cuidar-criar-amar-e-perder de novo); mas a filha, Andy, fica encantada e nem precisa ser convencida (mesmo não morando, mais, com eles). Eventualmente, com a falta de notícias, Hachi vai ficando.
Fonte da imagem: http://www.imdb.com/
E então, o filme vira praticamente uma novela de Manoel Carloszzzzz... passada fora do Leblon: vemos Parker e Hachi estreitando seus laços cada vez mais, enquanto Cate observa de longe. Parker vai trabalhar, e nosso (desculpe, SEU) auau o acompanha até a estação, interagindo com toda a cidade no caminho. Quando Parker retorna de seu trabalho, lá está o rapagão a esperá-lo na estação. Festinha, fuafinha, e seguem para casa. Ainda há protestos, mas Parker consegue ficar com o cão.
A vida segue para a família Wilson, e Hachi está lá, junto! Andy arruma um namorado, que logo se torna seu noivo (e tenta de várias maneiras interagir com o cão, mas logo aprendemos: Akitas não são cães comuns). E Hachi segue Parker. Enquanto Cate pouco a pouco vai aceitando e aprendendo a amar Hachi. Andy se forma, e Hachi segue Parker. Andy e Michael se casam, e lá está Hachi, na festa. E continua acompanhando Parker no trajeto para o trabalho. Chega um novo bebê na família Wilson, e Hachi segue firme forte. Até... que você vá assistir o filme para saber o que ocorre.
Fonte da imagem: http://www.imdb.com/
Lembram quando eu falei que "Akitas não são cães comuns"? Realmente não são. O filme deixa explícito que criar um exemplar da raça não é atividade para qualquer um. Embora cordatos, eles não são cães que se conquistam facilmente, nem se misturam com a galera. Por ter, por assim dizer, "um jeitinho cheio de opinião própria", eles não fazem o que se esperam de outros cães (como brincar e buscar bolas, por exemplo). O roteiro capta perfeitamente este espírito - tanto que, quando Hachi faz algo "de cão comum", a gente se surpreende, mas percebe imediatamente que algo irá acontecer e virar o filme de cabeça para baixo.
Por "virar o filme de cabeça para baixo", dá para entender o que já creio ter deixado claro alguns parágrafos atrás: Sempre ao Seu Lado é um filme de roteiro BEM formulaico. Cada segundo deste filme é construído de modo descarado a fazer você, car@ leitor@/espectador@, chorar copiosamente (embora no meio, haja risadas e situações ultrafofas. Mas posso parabenizar Stephen P. Lindsey por tentar desviar um tanto da fórmula e centrar parte do filme na vida familiar dos Wilson. Embora o filme se centre em Hachi e no seu olhar, a história em si não daria nem um média metragem. Estabelecer os vínculos familiares, os pensamentos de cada um e suas rotinas ajuda o público a se identificar ao menos com um dos membros e rever situações que pode estar vivendo neste exato momento ou pelas quais já passou - além de dar chances para que outros membros do elenco também tenham alguma chance para brilhar.
Fonte da imagem: http://www.imdb.com/
O melhor exemplo, aqui, é Joan Allen. No segundo em que vi seu nome nos créditos iniciais, me perguntei "o que raios uma atriz com prêmios importantes na estante faz num filme destes?". Realmente, Cate Wilson não é um papel grande, mas ela o defende com fibra, lhe dá estofo. E sua última cena com o cão, quando ela o pergunta "posso esperar aqui, com você?", para mim, é uma das maiores cenas do cinema. SEM BRINCADEIRA. O cão nada faz, nem reage. Não olha para ela, tal como uma criança autista. Mas é esta (falta de) reação que permitiu a Allen dar um show de interpretação e extravasar toda a dor que aquela mulher carregava dentro de si. Simplesmente lindo.
Outro nome que causa estranheza é Jason Alexander. Vindo de um enorme sucesso televisivo que foi "Seinfeld", ele poderia estar fazendo mais filmes e seriados televisivos. Em Sempre ao Seu Lado, a gente meio que espera algo super engraçado, estilo George Costanza. Rola o mau humor característico, mas nada além - mas as tentativas de Carl, o agente da estação, aparecer nos jornais que querem noticiar Hachi são levemente engraçadas - dão pra um pouco mais que um sorriso amarelo.
Fonte da imagem: http://fatoselivros.blogspot.com.br/
Eu tenho que aplaudir a coragem de Richard Gere. Um cara como ele conseguiu para si um luxo que poucos atores possuem em qualquer lugar do mundo: o privilégio de escolher QUALQUER PAPEL em QUALQUER PROJETO, apenas com a força do seu nome. E ele escolhe justamente uma história onde o foco central não seria ele, nem qualquer outro humano, mas sim um cão. Simplesmente porque a história real o emocionou a tal ponto de ele acreditar que ela deveria ser contada para o mundo inteiro, e não apenas ao Japão. E conseguiu juntar um time bem competente consigo numa empreitada feita apenas "por amor", pois raramente tal tipo de filme rende aos grandes estúdios.
Fonte da imagem: http://www.adorocinema.com/
A trilha sonora de Jan A. P. Kaczmarek é bem trilha daqueles dramalhões - mas é intencional. O objetivo claro de Lasse Hallström é fazer com que @ espectador@ chore a qualquer custo. Mas isso não quer dizer que Kaczmarek tenha se restringido apenas a temas chorosos - os temas são bem variados e casam bem com cada cena, ao mesmo tempo que sempre indicam com alguma nota mais grave que "algo" vai acontecer, e a partir da virada, o tom das canções se torna mais grave, mas não exatamente sombrio - como que evocando saudade.
Sempre aos Seu Lado é um filme despudoradamente manipulador. Todos os ingredientes de picadinho de cebola descascada com colírio japonês estão lá, e recheados com bichos fofos, para garantir que nem pedras saiam da sessão encharcadas de lágrimas. E é eficiente. Mesmo as almas mais conscientes de tal manipulação emocional acabam caindo nessa e derrubando ao menos uma lágrima furtiva (vide as senhoras que estavam na sala de espera da fisioterapia comigo, na época do carnaval. No fim, o filme é simples, bem feito e muito cativante. Para quem ama animais e não tem medo de assumir que chora em filmes emocionantes.
De volta à nossa sala de estar, ao final do filme, dona Sassá estava a lavar o chão sem precisar gastar água. E soltou uma frase que me encafifou: "O... (soluço) nome... (soluço) doooo... (outro soluço) cachorro... (mais um soluço) vai serrrrrrr... (QUASE foi um soluço) Haaaaaachi."
Imediatamente, estranhei. Tivemos o Beethoven, que nos foi tirado de forma muito brutal dez anos antes, e nem dona Sassá nem seu Lula quiseram outro cão, de novo. Eu, mesmo, nunca me atrevi a falar no assunto. De onde ela veio com essa de cachorro chamado Hachi? Nem toquei, mais, no assunto.
Eis que, numa terça-feira, eu chego em casa do trabalho, e encontro uma coisinha branca que cabia na palma da minha mão.Praticamente duas bolas peludas brancas com cinco palitinhos peludos brancos atrelados. Mal conseguia andar, uma gracinha! E era verdade. Hachi havia chegado em nossas vidas!
É um pequeno abusado, barulhento e impositivo - é o "machinho brabo", que não quer saber de chamego, se não o interessar. Mas é carente de viver por perto de todo mundo (mantendo relativa distância) e uivar só de se perceber sozinho e viver pedindo braço quando quer fazer charminho.
É a criatura mais sincera que conheço. Quando gosta de alguém, GOSTA. E DEMONSTRA, TODAS AS VEZES. Se não gosta, BENZA DEUS. Ama brincar e carrega em si, por baixo da casca grossa de "menino mau", uma alegria de viver e uma energia que me inspiram, que que desejo ter em mim. Este é o meu Hachi.
Fonte da imagem: http://fatoselivros.blogspot.com.br/

Há hoje, na estação de Shibuya, uma estátua de Hachiko, no lugar onde ele ficava esperando seu dono voltar.
Quero muito viajar ao Japão. Uma de minhas metas por lá é conhecer a estação de Shibuya e tirar uma foto junto à estátua do cão número oito original. É uma forma que eu tenho de agradecer à quele que, de certo modo, me trouxe o Hachi que tenho aqui comigo, e que me lembra todos os dias o quão maravilhoso é ter alguém tão fiel e companheiro do lado!

Você acha que o Tom deve colocar nota nos posts dos blogs Trigêmeos?
SIM! Só os textos, às vezes, deixa confuso.
TANTO FAZ. O importante é despertar a curiosidade de conferir.
NÃO! Pra que explicitar algo que já está no texto?
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